Tem umas horas bestas, meio morosas, em que parece que se vive de nostalgia.
Uma memória puxa a outra, que puxa a outra, a saudade é de tudo e cada coisa, com o pesar óbvio de que nada volta.
E não tem o que resolva. Só a vida, em seu curso irrevogável, que com a mesma voracidade com que deixou as coisas pra trás, vai puxando-as pelo tempo, trazendo as coisas daquele futuro inimaginável pro agora. - E agora? E daqui a pouco, ou muito? Qualquer resposta seria igualmente fantasiosa, mas já basta pra fazer figurar o presente como passado. E quase dá saudade também (já) do que ainda é próximo.
Mas a vida é mais rápida que o pensamento, mais dura e mais certa. Não é de especulações sentimentais.
Então adiante, Maria! Anda: que se parar, cai.
Mas, também, anda devagar. De vagar, talvez. Flanando, pra sorver o presente.
E divagar, também, como disse Millôr - por que não? - Mesmo que não seja feita de "especulações sentimentais", a vida deve ser mais que a sucessão crua das coisas. Só tem é que andar. Mesmo que isso inclua um certo lirismo brega, de vez em quando: não tem problema. Anda.
domingo, 10 de novembro de 2013
domingo, 3 de novembro de 2013
Encontrar-se
O sentimento era o de que, se fosse possível percorrer todo o caminho de volta, refazer os passos, as pazes, encontrar velhos conhecidos, aí eu entenderia quem eu sou. Quem eu fui, pelo menos. Se eu pudesse conversar com cada um, perguntando: "quem eu tenho sido?", se eu pudesse passar pelas situações em que fiz algo tão vergonhoso que embotei na memória, se eu pudesse prestar atenção à cara que fiz ao dar bom dia pr'aquela pessoa cujo nome não lembro... Se eu pudesse refazer todo o caminho, parece que poderia entender o âmago do meu ser.
Sabia que o sentimento era enganoso. Eu não encontraria comigo mesma em lugar nenhum. Não porque estivesse num lugar inalcançável, mas porque não existisse uma só eu, mesmo. E creio que justamente por essa segurança, a inquietude persistia: eu queria voltar todas as coisas, passear por elas, inquiri-las, até me descobrir. Podia ser no sonho dessa noite, podia ser numa metáfora, numa revelação, num insight. Podia ser no pássaro que percebi de manhã. A vontade era de me encontrar, única, irresoluta: aquela eu ideal, que eu involuntariamente tento copiar nesse mundo de sombras.
É, porém, que me detive um instante. E se fosse possível? E se eu me encontrasse? Podia ser nesse caminho de volta. Talvez fosse mais real, tangível e duro, mesmo, que uma descoberta mística. Talvez fosse pontiagudo. Talvez eu mesma, que fui, não fosse assim tão palatável. Claro que junto com o medo de conhecer sua pior versão, existe a tentação de ter que aprender a aceitá-la e daí conseguir suportar todo o resto de si mesmo. Mas fosse como fosse, qualquer versão que aparecesse me deixaria atônita. Se eu me encontrasse comigo nesse retrocesso, o que eu faria depois? O que sobraria pra eu vir a ser, depois de descoberta tão cabal? Quem poderia ser eu, dali em diante?
Certamente não poderia ser a mesma inocente de sempre. Definitivamente, eu não seria essa à qual já estou acostumada. E entre me perder ao me conhecer platonicamente ou continuar perdida no caos da multiplicidade, a curiosidade foi dando espaço à cautela. Afinal, nem existe isso, de indivíduo.
Sabia que o sentimento era enganoso. Eu não encontraria comigo mesma em lugar nenhum. Não porque estivesse num lugar inalcançável, mas porque não existisse uma só eu, mesmo. E creio que justamente por essa segurança, a inquietude persistia: eu queria voltar todas as coisas, passear por elas, inquiri-las, até me descobrir. Podia ser no sonho dessa noite, podia ser numa metáfora, numa revelação, num insight. Podia ser no pássaro que percebi de manhã. A vontade era de me encontrar, única, irresoluta: aquela eu ideal, que eu involuntariamente tento copiar nesse mundo de sombras.
É, porém, que me detive um instante. E se fosse possível? E se eu me encontrasse? Podia ser nesse caminho de volta. Talvez fosse mais real, tangível e duro, mesmo, que uma descoberta mística. Talvez fosse pontiagudo. Talvez eu mesma, que fui, não fosse assim tão palatável. Claro que junto com o medo de conhecer sua pior versão, existe a tentação de ter que aprender a aceitá-la e daí conseguir suportar todo o resto de si mesmo. Mas fosse como fosse, qualquer versão que aparecesse me deixaria atônita. Se eu me encontrasse comigo nesse retrocesso, o que eu faria depois? O que sobraria pra eu vir a ser, depois de descoberta tão cabal? Quem poderia ser eu, dali em diante?
Certamente não poderia ser a mesma inocente de sempre. Definitivamente, eu não seria essa à qual já estou acostumada. E entre me perder ao me conhecer platonicamente ou continuar perdida no caos da multiplicidade, a curiosidade foi dando espaço à cautela. Afinal, nem existe isso, de indivíduo.
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